Hospital Regional Huambo [Nova Lisboa]
Huambo [Nova Lisboa], Huambo, Angola
Equipamentos e infraestruturas
O projeto para o Hospital Regional de Nova Lisboa, atual cidade do Huambo, inseria-se num plano mais vasto de edifícios hospitalares proposto pelo Estado português para Angola. Localizado na atual Rua Silva da Carvalho, mantém, até hoje, a sua função de Hospital Central da cidade. A sua localização estava já prevista no plano urbano da cidade realizado por João Aguiar no âmbito do GUC (1947) integrada numa área mais ampla destinada a equipamentos de saúde, e adjacente à zona educativa como demonstra o plano do Estudo do Arranjo Urbanístico da Zona Escolar (Aguiar). A implantação proposta para o hospital vai ao encontro dos princípios genéricos defendidos por Aguiar, evidenciando a visão urbana assente em eixos estruturantes e monumentais, edifícios de baixa densidade e sectorização funcional.
Neste sentido, o projeto de Lucínio Cruz, realizado entre 1947 e 1952 no GUC coloca o eixo de simetria do edifício no seguimento do boulevard existente, acentuando o carácter representativo da obra. Segundo a memória descritiva, o edifício obedecia “aos mais rigorosos requisitos da moderna técnica”, e a sua implantação previa zonas arborizadas ao redor do edifício de modo a isolar o recinto dos ruídos da cidade. Do ponto de vista programático previam-se 208 camas, 55 destinadas a europeus e 153 a “indígenas”. A obra seguia assim os enunciados do Gabinete através da clara diferenciação entre a população branca e negra, claramente identificada nas peças desenhadas.
Sendo um caso representativo de uma relativa complexidade programática, pela dimensão e quantidade de serviços prestados, a mesma reflete-se na organização do conjunto. O edifício é composto por dois corpos interligados. O corpo da entrada principal, com um piso, destaca-se do conjunto, com a entrada monumental a marcar um eixo de simetria, enfatizando o carácter de uma arquitetura de “representação”. A partir da entrada, os espaços interiores organizam-se à volta de um pátio central, aos quais se sucedem as principais dependências hospitalares.
O corpo longitudinal posterior tem dois andares, e distingue-se fundamentalmente pelo seu longo comprimento, sendo pautado pelo ritmo constante dos pilares que protegem as varandas ininterruptas ao longo de todo o edifício, quer no alçado principal, quer no tardoz, em ambos os pisos. A métrica da estrutura representada na fachada é apenas interrompida nas duas entradas de admissão de doentes formalmente semelhantes, uma em cada extremo do bloco, com duas rampas de acesso laterais no piso térreo e com amplas varandas no primeiro andar que protegem a zona da entrada.
As circulações interiores são garantidas por três acessos horizontais principais: a galeria exterior de visitas (diretamente ligada ao hall de distribuição) dividida para europeus e indígenas, a galeria reservada aos doentes e o corredor central de serviço. De acordo com as intenções do autor, o edifício implanta-se de forma a que a sua fachada de maior desenvolvimento se alonga na direcção nascente-poente, por ser mais favorável para a defesa de raios solares e para o melhor aproveitamento dos ventos dominantes. O edifício denota uma preocupação compositiva e organizacional que resulta no formalismo do desenho em planta. Ao nível da organização das funções é notória uma certa homogeneidade, o mesmo acontecendo a nível dos alçados, onde se enfatiza a simetria, a marcação da entrada e o remate com platibanda.
No plano para a zona hospitalar, o bloco principal é reforçado com outros equipamentos, entre eles a Residência das Irmãs que seria implantada a poente, a Casa Mortuária e Autópsias e o Dispensário a nascente. A memória descritiva de Eurico Pinto Lopes (1952), autor do projeto para casa Mortuária confirma a intenção da implantação sugerida do plano, ainda que a mesma não se tenha verificado. No entanto, mantém-se a localização para o Dispensário Anti-tuberculose “Centro Regional” de Mário de Oliveira (1951), proposto para Luanda e que foi construído neste recinto hospitalar. O bloco cumpre a boa acessibilidade com zonas envolventes de proteção arborizadas, tal como enunciado nas peças escritas do processo. Este foi um encargo do então governador Geral de Angola, e segundo o programa estabelecido pelos Serviços de Saúde da Província o Dispensário tinha como funções a prospeção, vacinação e tratamento da doença.
A entrada é marcada pela escadaria e pela grande dimensão do vão, que assegura o encaminhamento à esquerda para a sala de tratamentos ou faz a ligação ao corredor central que distribui o acesso às diversas dependências. O edifício de um piso, fortemente marcado pela horizontalidade, expressa formalmente tanto através dos vãos ligados entre si através de uma pala de sombreamento, como pelo desenho da própria caixilharia. Mário de Oliveira explicita na memória descritiva que a orientação a adoptar devia ser feita de modo a que a fachada de maior desenvolvimento ficasse defendida contra a insolação e ao mesmo tempo beneficiasse dos ventos dominantes. De modo a acentuar os efeitos da ventilação, a cobertura seria realizada com dois grupos de telhas ventiladoras, ficando um deles junto da cornija e outro junto do pau da fileira.
No seu conjunto, o hospital resulta da conjugação entre os aspectos programático-funcionais, a adequação ao local e ao clima, e algumas premissas estilísticas. Entre estas últimas estão a preocupação compositiva que enfatiza a simetria, o formalismo da organização em planta, e o desenho exterior dos diversos corpos que são rematados por amplas coberturas inclinadas em telha e os respetivos beirais, mantendo o edifício próximo de algumas tendências formais da arquitetura do Estado Novo.
Ao longo do tempo, foram realizadas diversas intervenções de modo a consolidar o complexo hospitalar, desconhecendo-se na maior parte dos casos os autores dos projetos. Em 2014, ambos os edifícios do conjunto hospitalar se apresentavam em bom estado de conservação mantendo as funções para os quais foram projetados. Ao mesmo tempo, realizavam-se obras de ampliação e revitalização dos edifícios complementares ao bloco principal.
Ana Vaz Milheiro
(projeto GCU, FCT ref.ª PTDC/AUR-AQI/104964/2008)