Laboratório de Engenharia de Angola (LEA)

Laboratório de Engenharia de Angola (LEA)

Luanda [São Paulo de Luanda], Luanda, Angola

Equipamentos e infraestruturas

O Laboratório de Engenharia de Angola (LEA) (1963 / 1965) destaca-se na obra de Vasco Vieira da Costa (1911-1982), uma vez que o arquitecto não teve muitas oportunidades para trabalhar em programas que ultrapassassem a escala do edifício.

Em 1959, Vasco Vieira da Costa inicia uma longa e activa colaboração com o LEA mantendo-se como consultor durante 20 anos. Quatro anos depois realiza o projecto do complexo LEA. O programa inovador contribui para o desenvolvimento de uma obra de grande escala que implica uma estratégia de implantação dirigida para uma intervenção urbana na periferia da cidade. Vasco Vieira da Costa propõe para a ocupação do lote com 7ha um sistema de construções pavilhonares, cujo resultado pode ser equiparado à organização do espaço de trabalho de uma pequena comunidade.

Localizado na zona Sul de Luanda junto ao musseque Prenda, na proximidade da Unidade de Vizinhança nº 1 (1963-1965) de Fernão Simões de Carvalho, sendo sua contemporânea e fazendo provavelmente parte do mesmo esforço de organizar não só a cidade do asfalto mas também promover o seu crescimento consolidado.

Na planta de Luanda, o laboratório destaca-se no musseque como um conjunto de grande dimensão, definido por eixos ortogonais e espaços verdes distribuídos entre os pavilhões.

É clara a intenção de criar uma hierarquia de percursos, quer viário quer pedonal, associada à concepção de pequenas praças que contribuem para a estruturação do conjunto. As caleiras de águas pluviais são integradas neste sistema acompanhando os caminhos pedonais, e assim desenhando o espaço público.

A entrada faz-se pela Rua do Laboratório de Engenharia, especialmente traçada para aceder a este grande equipamento. Os cerca de 7 ha livres de restrições libertariam aparentemente o arquitecto de limitações na implantação dos edifícios. No entanto, na memória descritiva o arquitecto explica como a topografia do terreno foi um factor determinante na implantação dos vários pavilhões que albergam os laboratórios.

A propósito dos pavilhões de Geotecnia (A), Estradas e Aeródromos (B) e Edifícios e Estruturas (C) o arquitecto refere justamente que “a necessidade de manter o pavimento à mesma cota do terreno, impôs a implantação destes pavilhões paralelamente às curvas de nível, visto afigurar-se absolutamente condenável realizar dispendiosos movimentos de terra que viriam perturbar a paisagem do “sítio”. Como aquela implantação se traduz numa orientação incorrecta relativamente ao factor insolação (eixo maior de edificação segundo a direcção Norte-Sul) foi esse facto que condicionou todo o estudo das plantas.

Estes três pavilhões situam-se no extremo norte do conjunto, com 30 metros de intervalo entre eles, e são coroados pelas oficinas e pelo pavilhão de Materiais de Construção implantados num eixo perpendicular. Esta distância entre os blocos foi prevista de forma a deixarem espaço livre suficientemente amplo destinado a campo de experiências.

A planta dos pavilhões é idêntica, definindo um tipo repetível, desenvolvendo-se de acordo com quatro funções básicas: serviços de secretaria, gabinete de trabalho, sala geral e salas especiais. A sala geral é o centro do laboratório e destina-se à instalação das máquinas e aparelhagem, comunicando directamente com os gabinetes e salas especiais.

Projectar de acordo com o clima é um dos aspectos centrais na obra de Vasco Vieira da Costa que é reafirmado na Memória Descritiva uma vez que a preocupação com a organização dependeu principalmente do estudo judicioso dos cortes transversais, onde se procurou por meios simples e económicos, atenuar os inconvenientes resultantes da incorrecta orientação a que a topografia do terreno conduziu. Na verdade, Vasco Vieira da Costa tirou proveito da exposição de uma das fachadas de maior desenvolvimento aos ventos predominantes de Sudoeste, criando condições para que todos os espaços de trabalho fossem ventilados transversalmente, de modo  a evitar qualquer tipo de ventilação mecânica. As paredes, no sentido longitudinal são suspensas da lage, não tocando no tecto, facilitando deste modo a ventilação transversal.

A cobertura inclinada é outro dos sistemas de arrefecimento que o arquitecto usa, criando um vazio entre a cobertura e a lage em betão, permitindo a circulação do ar. Esta mesma inclinação e a abertura de diferentes vãos em paredes opostas criam um efeito funil que arrefece a sala geral.

Estes vãos são coroados por palas em betão, ou por persianas fixas de fibrocimento moldado funcionando quer como sombreamento, quer como protecção contra a chuva.

Todas as fachadas têm um desenho simples e modular pondo em evidência a rigorosa modulação da planta reflectindo a alternância ritmada dos cheios e vazios. Os vãos das fachadas nascente compostos por janelas-beta seguem a mesma modulação, sendo pontuadas no espaço correspondente aos gabinetes pelas palas em betão. Num interessante jogo de cheio vazio os vãos da zona sul e das salas de trabalho intercalam com os cheios das instalações sanitárias, onde os vãos se encontram a uma cota superior.

A poente localiza-se a sala geral e a sua fachada com vãos de maiores dimensões é pontuada por portas basculantes, orientáveis e fixáveis em diversas posições de forma a funcionar como toldo. Estas palas, portas e grelhas são elementos plásticos que vêm enriquecer estes volumes de um piso com duas águas, aparentemente simples, conferindo-lhes uma enorme plasticidade. O acesso é feito a sul do edifício onde se encontra a secretaria, que tem ligação à sala de espera e gabinete destinado ao Chefe de Serviço, conseguido através de um hall exterior, separado do exterior por uma parede suspensa da lage e de uma parede em grelha de betão, que assinala a entrada do edifício. A parede da secretaria que comunica com este hall é composta por um ripado orientável de madeira até aproximadamente 1.00m de altura e janelas-beta até ao tecto, criando uma fachada ventilada de enorme transparência.

O edifício de Admnistração e Biblioteca e o Pavilhão de Química seguem a mesma implantação Norte-Sul. O pavilhão de Química surge como um muro, com vãos a uma cota superior coroados por palas de betão.­ Este volume é ladeado por outra classe tipológica de edifícios, os D, E, F e G­, que correspondem a laboratórios menores, orientados segundo um eixo Este-Oeste. O acesso a estes pavilhões é feito através de pequenos pátios.

De frente para a entrada do conjunto, estes pavilhões são desenhados com uma fachada principal de enorme plasticidade. O volume de duas águas e apenas um piso, é engenhosamente trabalhado na fachada poente através da cor e dos muros dos pátios, assim se transformando uma simples empena, numa fachada claramente moderna, quase escultórica. Esta imagem é atingida de forma muito simples, reflectindo por isso mesmo a genialidade do arquitecto que cria um momento poético numa arquitectura marcadamente funcional. Estes pavilhões são extremamente fechados, apenas com vãos na parte superior, através dos quais é feita a admissão de ar e ventilação do espaço.

O edifício da administração, apesar dos seus três pisos, afirma uma horizontalidade marcante decorrente do comprimento de 135m, com uma largura de 15m, que é acentuado pelas suas longas galerias projectadas para o exterior. Esta horizontalidade é pontuada pelo volume da caixa de escada, que se ergue por cima da cobertura deste edifício.

 As oficinas localizam-se a norte perto de uma entrada secundária e são destinadas a experimentação mecânica e automóvel.

Apesar de utilizar distintas tipologias de edifícios, o conjunto mantém uma clara unidade que decorre da concepção geral m reforçada com elementos comuns: as cores (cor-de-laranja, verde e branco) aplicadas nos mesmos elementos em todos os edifícios; as grelhas em betão e as palas em betão dos vãos; as gárgulas, os elementos estruturais ou os ripados de madeira.

É este léxico, composto por elementos escultóricos, que permite manter um fio condutor quebrando simultaneamente a monotonia da obediência funcional da arquitectura ao programa.

Actualmente, algumas alterações começam a descaracterizar esta obra. As grandes portas basculantes em madeira foram substituídas por portas de metal de correr, as palas em betão servem muitas vezes para apoiar os aparelhos de ar condicionado, um dos pavilhões foi forrado a azulejo, e  foi acrescentado mais um piso.

 

Original de Ana Tostões e Ana Braga

(FCT: PTDC/AUR-AQI/103229/2008)

Adaptação de Ana Tostões e Daniela Arnaut.

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