Aeroporto Gago Coutinho / Aeroporto Internacional de Maputo

Aeroporto Gago Coutinho / Aeroporto Internacional de Maputo

Maputo [Lourenço Marques], Maputo, Moçambique

Equipamentos e infraestruturas

O Plano Geral do Aeroporto de Lourenço Marques, aprovado em 1948, procurava reduzir os custos de construção de um aeroporto novo pela progressiva adaptação do conjunto das instalações existentes às novas necessidades técnicas e funcionais. Este plano estruturou genericamente um conjunto de intervenções que decorreram em duas fases distintas: numa primeira fase, a construção de novos edifícios e a ampliação das pistas existentes, sua pavimentação e iluminação; numa segunda fase, a construção de um novo edifício terminal, por inadequação do existente ao aumento do tráfego aéreo e ao papel central desempenhado pela infraestrutura no sistema de navegação aérea da antiga província ultramarina.

Em 1952, uma missão da Direção Geral da Aeronáutica Civil (DGAC), visitou os aeroportos de Lourenço Marques, Beira e Lumbo. O seu objetivo era estudar as necessárias condições para que estas infraestruturas servissem convenientemente as carreiras de longo curso, obras que seriam financiadas pela primeira fase do I Plano de Fomento (1953-1958).

Em 1953, terminadas a terraplanagem e pavimentação das pistas do aeroporto laurentino, foi reconhecida a urgente necessidade de um novo edifício de comando para os serviços administrativos e técnicos, cujo estudo preliminar foi elaborado no Serviço de Obras (SO) da DGAC. Na torre de comando foi inaugurado, em 28 de maio de 1959, por ocasião das comemorações do 33.º aniversário da Revolução Nacional, o Centro de Comunicações Aeronáuticas de Lourenço Marques.

O edifício da aerogare foi projetado por Cândido Palma de Melo (1922-2003), entre 1955 e 1960, no SO da DGAC. O primeiro anteprojeto, desenhado em 1955, foi apresentado e discutido no início de 1956 com os delegados dos serviços provinciais moçambicanos. Em função de novos dados programáticos surgidos numa reunião internacional da especialidade, este anteprojeto foi revisto e atualizado através de novo estudo. O projeto final foi concretizado entre 1958 e 1960.

O concurso para arrematação da empreitada de construção teve lugar no dia 16 de junho de 1960, tendo a edificação tido início no primeiro trimestre de 1961. O terminal foi aberto ao tráfego aéreo em 23 de maio de 1963 e oficialmente inaugurado em 17 de junho do mesmo ano, data comemorativa da chegada ao Rio de Janeiro de Gago Coutinho e Sacadura Cabral no final da primeira travessia do Atlântico-Sul. Em 28 de março de 1964 foi oficialmente batizado como Aeroporto Gago Coutinho, através de portaria publicada no Boletim Oficial da antiga província.

Obras de ampliação e reforço da pista principal para 2700m e da secundária para 1700m estavam em curso em 1969, de forma a poderem receber os novos jatos Boeing 727 das Linhas Aéreas de Moçambique/DETA, a partir do início de 1970, e Boeing 707 da TAP, desde junho do mesmo ano. Em 3 junho de 1973 nelas aterrou um Boeing 747 da TAP, inaugurando carreiras bissemanais regulares entre Lisboa e Lourenço Marques com a maior aeronave de passageiros então existente. A aerogare, por outro lado, será modernizada e ampliada entre 1970 e 1972. O aumento do comprimento total do edifício, que passou de 208,4m para 232,4m, e o crescimento do número de coberturas abobadadas, dos espaços cobertos antecedendo as entradas principais do alçado sudeste e dos volumes salientes do alçado noroeste, constituíram alterações significativas ao seu desenho inicial.

O processo de ampliação e modernização do Aeroporto Internacional de Maputo, iniciado em 2006, compreendeu a demolição da aerogare existente, concluída em 2011. Dela apenas se conservaram a torre de comando e o corpo que a ligava ao volume da antiga aerogare, espaços agora ocupados por instalações administrativas dos Aeroportos de Moçambique e pela sala VIP.

O Aeroporto Internacional de Maputo localiza-se na periferia da cidade, na zona de expansão das instalações do antigo aeródromo de Mavalane. Situa-se no remate de uma avenida desenhada pelo Gabinete de Urbanização do Ultramar, com o apoio técnico dos Caminhos de Ferro de Moçambique e da Aeronáutica Civil. Batizada Avenida Marechal Craveiro Lopes, atual Avenida Acordos de Lusaka, esta via estava prevista no conjunto dos trabalhos a efetuar no âmbito do Plano Geral de Urbanização de Lourenço Marques (1947-1955). Constituía um eixo de trânsito ligando a estação ferroviária e a entrada principal do porto marítimo, na antiga Praça Mac Mahon, atual Praça dos Trabalhadores, com as novas instalações do aeroporto.

Os edifícios do terminal, serviços técnicos e torre de comando do antigo Aeroporto Gago Coutinho integravam-se no desenho do Plano de Conjunto da Zona Urbanizada, datado de maio de 1958. O desenho do plano assenta numa matriz compositiva formada por duas malhas que se intersectam segundo ângulos de 45º. Previa-se a criação de uma vasta alameda ajardinada e arborizada, rodeada por parques de estacionamento e por edifícios contendo as instalações de apoio ao aeroporto, encerrada a noroeste por um edifício de grande extensão longitudinal que compreendia a aerogare, os serviços técnicos e a torre de comando.

O jogo de volumes que compunham este edifício era unificado por um longo piso térreo, a sua dominante longitudinal acentuada pelos vãos exteriores horizontais. A esta base sobrepunha-se, na zona da aerogare, um segundo piso com idêntico desenho. O equilíbrio assimétrico do conjunto era assegurado pela distribuição de massas, entre o prisma vertical da torre de controlo, intersetando transversalmente o piso térreo, rematado na cobertura pela sala de comando envidraçada, e o desenvolvimento longitudinal do volume da aerogare, coroada pelo ritmo ondulante das cinco naves abobadadas.

No alçado sudeste destacava-se a pala que antecedia a entrada principal e que assinalava o eixo central da alameda fronteira. Na frente noroeste dois volumes retangulares projetavam-se desde dois módulos abobadados e uma galeria exterior coberta soltava-se do corpo principal, ligando em toda a extensão do edifício as diversas saídas para a pista. A torre de comando, completamente encerrada na frente sudeste, equilibrava a sua composição através de faixas salientes de vãos horizontais, dispostos nas restantes três fachadas.

O programa do edifício terminal, concebido para suprir as necessidades do tráfego num período de vinte anos, foi desenvolvido ao longo das diferentes fases de projeto e informado pelas mais recentes exigências internacionais para o projeto de aerogares, nomeadamente pelas normativas da Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA). Resultado do acoplamento de uma sequência modular de corpos iguais, a aerogare foi concebida em planta livre, permitindo futuras alterações da organização interna sem prejuízo das formas arquitetónicas globais e da estrutura de suporte. O espaço interior organizava-se em torno de uma praça de distribuição longitudinal, na qual convergiam as circulações de passageiros e público. Elemento agregador da composição assimétrica geral, esta praça ligava os dois pisos principais do edifício através de vazios pontuais, escadarias e zonas de pé-direito total. O núcleo deste espaço central localizava-se no vestíbulo principal onde uma escadaria de escultórico desenho curvo conduzia ao bar do segundo piso, rematando o eixo transversal da entrada principal.

Os sistemas estruturais e construtivos utilizados na edificação da aerogare recorreram predominantemente à pré-fabricação de componentes e a materiais estandardizados. A estrutura principal do edifício, dimensionada segundo um módulo base de 4m, foi concebida como um sistema de pilares, lajes e vigas de betão armado. Os cinco módulos abobadados, com 20m x 12m, separados entre si por módulos intercalares de 4m, tinham as coberturas suportadas por asnas metálicas revestidas com chapas de alumínio.

A proteção climática do edifício foi garantida através da utilização de mecanismos e sistemas construtivos adequados: quebra-luzes verticais orientáveis, palas horizontais e verticais de betão, coberturas duplas, galerias cobertas e vãos de ventilação superior nos caixilhos exteriores e nas divisórias interiores.

Neste edifício, de desenho fundamentalmente utilitário, apenas quatro elementos expressavam o conceito de integração das artes numa obra de arte total (Gesamtkunstwerk): os dois painéis cerâmicos colocados frente a frente na sala de espera, desenhados por Fausto Rocha e Isabel Melo Ferreira; e duas pinturas de grande dimensão, patentes na sala VIP, da autoria de João Aires (1921-2001).

O esquema compositivo da aerogare do Aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro (1937-1944), pelos irmãos Marcelo (1908-1964) e Milton Roberto (1914-1953), pode ter influenciado o projeto da aerogare de Lourenço Marques: ambos têm uma análoga estruturação interna em torno de um grande espaço central longitudinal, pontualmente perfurado por zonas de pé-direito duplo, rodeado por espaços menores de apoio e intersectado transversalmente pela sequência espacial composta pela entrada principal, vestíbulo e sala de espera aberta sobre a plataforma. A referência modelar para a programação da aerogare de Lourenço Marques foi constituída pela aerogare do Aeroporto General Craveiro Lopes, em Luanda (1947-1954), projetada por Keil do Amaral (1910-1975). As semelhanças entre ambos os projetos encontram-se no dimensionamento e funcionamento das instalações destinadas ao público, na articulação com o espaço exterior envolvente e na disposição assimétrica dos diferentes corpos volumétricos. Os contactos formais entre ambos são sobretudo evidentes na utilização da mesma linguagem arquitetónica, intimamente vinculada aos princípios e formas do Movimento Moderno internacional, conferindo ao novo equipamento, na época da sua inauguração, um significado que ultrapassava a sua mera função infraestrutural: tornava-se um símbolo de moderna contemporaneidade na entrada principal da antiga província ultramarina.

 

Projecto de Investigação “Coast to Coast - Late Portuguese Infrastructural Development in Continental África (Angola and Mozambique): Critical and Historical Analysis and Postcolonial Assessment” [PTDC/ATP-AQI/0742/2014]

Coordenado por Ana Vaz Milheiro

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