Dondo

Lat: -9.687789000172800, Long: 14.421971994052000

Dondo

Kwanza Norte, Angola

Enquadramento Histórico e Urbanismo

Junto à foz do Rio Mucoso, a população encontrava‐se dispersa por várias "banzas" rodeadas de campos de cultivo que aproveitavam a abundância de água e a fertilidade do solo. Em mercados semanais, permutavam‐se bens alimentares e vários utensílios de produção local. No entanto, o povoamento inicial experimentou profundas alterações durante o longo período que durou a conquista portuguesa. Após a fundação do presídio em 1583, passaram a afluir com maior frequência caravanas de escravos provenientes de outras regiões (Silva, 1997). Com efeito, devido a uma localização geográfica privilegiada, as rotas caravaneiras percorriam vastos territórios até atingirem o Dondo, na margem direita do Kwanza. Interrompida a antiga feira durante os confrontos mais violentos, foi retomada e regulamentada em 1625 pelo governador Fernão de Sousa, de modo a corresponder ao volume crescente de transações de escravos que eram encaminhados para o litoral. Os novos protagonistas desse comércio eram na sua maioria pombeiros que percorriam a região do Kwanza, na qualidade de intermediários dos capitães‐mores e dos negociantes do litoral, tanto portugueses como brasileiros. A partir do século XVIII, à medida que as práticas africanas de permuta a curta e a longa distância foram integrando novas técnicas comerciais, a importância do Dondo aumentou, tornando‐o o maior empório comercial do interior, sendo, além disso, a única feira servida por uma via fluvial (Venâncio, 1996). O transporte de géneros para Luanda deu ao porto fluvial a função aglutinadora de gentes e mercadorias tão diversas como o sal da Quissama, peixe seco, víveres, algodão, artefactos de cobre e ferro, tacula, panos, marfim e cera. Os escravos que afluíam à feira do Dondo provinham de regiões cada vez mais distantes no interior do continente, e prosseguiam o caminho por terra até Luanda. Com o desenvolvimento do comércio lícito, a partir dos meados do século XIX, continuaram a afluir regularmente à vila as comitivas de ambaquenses, bangalas e songos, transportando cera, marfim, borracha e grande variedade de outros produtos que eram enviados de barco para Luanda, como o café, produzido nas fazendas do Cazengo e do Golungo, durante o primeiro surto cafeícola registado em Angola. Para responder ao incremento da produção agrícola e para o carreto, os efetivos em escravos aumentaram na região. Também a importância administrativa do Dondo refletiu a prosperidade económica da sua população, quando os antigos presídios de Cambambe e Massangano perderam as funções fiscais e administrativas a seu favor. Com a criação do concelho em 1857, foi eleita a comissão municipal, que procedeu à limpeza e ordenamento do aglomerado urbano. Foi então construída a Igreja de Nossa Senhora do Rosário e ainda um forte, um quartel para duas companhias móveis, duas companhias de empacasseiros e um destacamento de caçadores, bem como um paiol de pólvora, entre 1859 e 1868. Foram abertas estradas em direção a Pungo‐a‐Ndongo e Cassanje, na época em que o Dondo era o principal aglomerado urbano do interior, ligado a Luanda a partir de 1866 por carreira regular de barcos a vapor da Companhia de Navegação a Vapor no Cuanza. O surto económico da povoação fundamentava a petição de 1868, apresentada pelos moradores do Dondo, para sua elevação a vila: "Esta recente povoação, situada na margem direita do rio Quanza... é atualmente uma das mais florescentes, comerciais e numerosas da provincia [cerca de 2000 almas, entre elas muitos europeus]... Estabelecimentos filiais das casas comerciais do Dondo guarnecem as margens do Quanza... comerciantes de outros concelhos vêm fornecer‐se nas casas do Dondo... A posição desta povoação, a existência da companhia de navegação a vapor, além de bom número de embarcações de cabotagem... empregadas no comércio entre a capital e o D., tornam esta povoação da maior importância e esperançosa de ser em poucos anos uma cidade" (Arquivo Histórico Ultramarino, 1868). No último quartel do século, o Dondo atingiu o maior volume de negócios com produtos como a cera, a borracha e o álcool. Era então ponto de passagem obrigatório de funantes, aviados e exploradores que se dirigiam do litoral ao interior. Os grandes armazéns e casas comerciais onde eram acumuladas as mercadorias deixaram marca na vila.
Na viragem do século, porém, entrou em rápido declínio em consequência de dois fatores: os efeitos negativos do caminho‐de‐ferro Luanda‐Ambaca que atingiu o Lucala a partir de 1899, sendo as rotas comerciais desviadas e, com elas, as mercadorias dos velhos caminhos do sertão; e a quebra do comércio da borracha, que afetou os ganhos das casas comerciais e a economia da colónia. O Dondo perdeu parte da sua população nas primeiras décadas do novo século, mantendo‐se porém como um pólo comercial de âmbito regional (em particular no comércio do óleo de palma e coconote), reanimado pelo ramal de caminho‐de‐ferro que uniu Zenza ao Dondo. Com a construção da ponte sobre o Kwanza no início da década de 1960, o trânsito de mercadorias e passageiros por camionagem voltou a reanimar a vila, tornando‐a um importante centro de comunicações entre o norte e o sul de Angola (Granado, 1959). Com a entrada em funcionamento da barragem de Cambambe, foi dado início, nas décadas de 1960‐1970, a um plano de industrialização que autorizou a instalação de fábricas de prensagem de algodão, de desfibramento de sisal, de óleo de palma, de serrações de madeira, de uma fábrica de cerveja e outra fábrica de tecidos estampados de algodão destinados ao mercado interno, que mobilizou muita mão‐de‐obra e transformou matéria‐prima produzida na colónia.
A primeira intervenção urbanística respondeu ao crescimento operado ao longo do século XVIII, quando a intensidade do tráfico de escravos na feira do Dondo criava problemas diários na vida de homens livres e escravos. Num primeiro momento, foi promovido o saneamento urbano através do aterro de pântanos, do abastecimento de água em fontanários e da construção de alguns edifícios públicos. O núcleo embrionário em quadra, a partir do qual foi implantado o traçado ortogonal, era o modelo característico da era pombalina. No "traçado rectilíneo da rede urbana de planície" (Batalha, 1951 e 2008), foram sendo erguidas grandes casas de negócio com quintais para escravos e mercadorias. As lojas de um piso e alguns sobrados na Rua Capacala traduzem a solidez de algumas famílias antigas do Dondo, cujas campas e mausoléus perpetuam a sua memória no cemitério da vila, já murado desde 1850. A arquitetura civil do Dondo caracteriza‐se por construções térreas de grossas paredes de adobe cobertas de telha, com fachadas rasgadas por uma sucessão de portas e janelas em arco, onde os umbrais contrastam com as cores das paredes. Acrescente‐se que na época, o povoado contava com catorze casas de negócio, cinquenta e cinco casas de pedra e barro cobertas a telha e cinco casas de sobrado. Subsidiária do conceito imperial de urbanização, a vasta Praça da Quitanda, junto ao rio, era o centro de toda a azáfama comercial, local de embarque e desembarque das mercadorias destinadas a Luanda e à exportação. Num segundo momento, a expansão urbana ocorrida nas décadas de 1870‐1880 exigiu a construção de novas estruturas como os Paços do Concelho, o hospital, o mercado e o açougue; o passeio público foi arborizado e instalado o coreto para a banda de música. Ampliando os espaços verdes, os largos arruamentos foram sombreados com acácias rubras. A vila passou por uma transformação radical no aspecto sanitário e urbanístico. Foi a primeira em Angola a ver instalada a iluminação pública. A prosperidade comercial proporcionou a construção de alguns edifícios de dois pisos na Rua Principal (antiga Capacala), no final do século XIX. Já no século XX, existia uma escola oficial, uma católica e outra evangélica, e em 1957 foi construído um novo hospital, que se empenhou no combate à doença do sono que, nessa altura, era ainda o grande flagelo na região. Em termos urbanísticos, "a singularidade [...] do Dondo provem [...] duma conjunção de dois elementos: as velhas casas de cunho tradicional lusitano e as portentosas árvores africanas. As espessas paredes das construções e as frondosas copas do arvoredo irmanaram‐se numa aliança defensiva contra os raios escaldantes do sol". Com efeito, esta "visão urbana que será já única em Angola [...] pela sua beleza natural e grandiosidade de proporções [...] dir‐se‐ia uma amostra da exuberante floresta tropical dentro da povoação".

Arquitetura religiosa

Equipamentos e infraestruturas

Habitação

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